quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Quase Irmãos






   Segunda feira de manhã. Por volta das oito, Carolina e Thiago estavam sentados, um ao lado do outro em frente ao computador. Era muito comum ver esse quadro diariamente. Mesmo não sendo irmãos, foram criados juntos e se conheciam há muito tempo, desde que usavam fraldas. Tinham a mesma idade, quinze anos. Estudavam na mesma escola; discutiam sobre os mesmos assuntos; frequentavam os mesmos lugares, apesar de existir diversão adolescente em cidade de interior.
   Estavam na casa de Thiago. Ele morava com os pais e o irmão: A mãe estava na cozinha; seu pai na prefeitura. Trabalhava em um cargo administrativo ao qual entrava prefeito, saia prefeito (o mesmo valia aos funcionários, em cada gestão um batalhão novo) e ele permanecia, era um funcionário exemplar; seu irmão tinha só quatro anos, devia brincar com seus bonecos decapitados.
   Mais tarde poderia chover e bastante, pois o frio que fazia era extraordinário: Percebera que Carolina pedia agasalho. Ainda estava nublado, ventando muito.
   Em todos esses anos Thiago nunca notara a proximidade que eles tinham. A distância mínima das cadeiras, a risada de Carolina ao assistir o vídeo engraçadíssimo que Thiago encontrara por acaso na internet. O braço dela roçara no seu, bem de leve. Ele começava a ficar nervoso sem saber o porquê. A cabeça de Thiago estava vazia, aérea, como se estivesse no quarto e ao mesmo tempo flutuando em algum outro lugar, só assistindo a cena que se passava lá em baixo.
    Nem um casal de namorados se conhecia tão bem quanto eles. Um sabia os segredos do outro, mesmo que fossem de nenhuma importância. Também, nunca reparara que Carolina fosse bonita, talvez uma das mais bonitas que conhecia: Lábios carnudos; nariz arrebitado; olhos doces, como mel; cabelos castanho-claros; timidez de donzela; seu corpo, ainda estava amadurecendo, a infantilidade de sua voz e gestos era clara.
   Thiago, movido por um instinto indistinguível que nascera com o momento, passou seu braço esquerdo em torno da cintura de Carolina.
   - O que foi? – Perguntou Carolina, percebendo que seria abraçada.
   - Nada... – Foi vaga e tímida resposta dada.
   Sem mais questionar, ficaram nessa posição durante alguns segundos. Continuando a investida, Thiago abraça Carolina com mais força.
   - O que você está fazendo? Está machucando! – Tomara cuidado com o tom e altura que falava, não queria perturbar a mãe do amigo.
   Ele não respondera.
   Fizera tudo isso de forma mecânica, calculada como se tivesse lido algum passo a passo. Tinha um olhar sério no rosto de quem está totalmente decidido a ir até o fim, só precisava seguir o que planejara no dia anterior.
   - Que brincadeira é essa?  Você sabe que não gosto disso. – E ele sabia, Carolina era muito tímida, tanto contato a deixava em pânico.
   Sem mais espera, Thiago a beija. Ela relutara. Fora tão rápido. Agora, ela é agarrada com os dois braços, braços fortes os de Thiago. Não eram ósculos, literalmente Carolina era devorada. Como gritar com a boca ocupada? Era a única resposta que ela desejava. Fora erguida por Thiago que a abrigava a permanecer passiva. As suas mãos ferozes corriam em busca dos seios ainda em desenvolvimento, porém apalpáveis.
   Depois de saciado, ela a largou. Ela estava com o rosto rubro; cabelo em desalinho; vestes rotas e semblante triste. Parecia que ia chorar.
   Ao perceber o que fizera, sentiu-se mal. Por que agira com tanta brutalidade? De fato, nunca saíra de si como nesse momento. Ambos se encaravam, calados. A única pergunta era por quê...

***


      No dia seguinte, na escola, Thiago conversava com João Paulo do segundo ano. Garoto esperto, nem tanto nas atividades acadêmicas, mas na escola da vida. Entendedor de muitas coisas, dentre elas, o coração feminino. Em uma conversa com João Paulo, ele dissera o seguinte:
   - Pra que a menina goste de você, antes você tem que fazer com que ela goste. Mostrar o motivo certo.
   Ouvia atento tudo que ele tinha a dizer. Um boato antigo apontava João como o mais ‘fogoso’; ganhou esse título das próprias meninas, do fundamental e médio. Era assim que era conhecido por elas, ‘fogoso’. Ele mesmo já disse que fora pego pelo marido da Professora Ângela enquanto a mesma acariciava a sua região púbica.
   Por esses e outros pormenores compunham a reputação de João Paulo.
   Mas afinal, mesmo com a ajuda desse inexorável mestre na arte da conquista, por que falhara? Reproduziu mentalmente casa passo dado no dia anterior e não achou explicação: Carolina tinha que ter motivos para se apaixonar por ele, ou era o que deveria.
   - Talvez você não tenha a pegada...
   A pegada! Era evidente, a pegada! O que era mesmo?
   - Ora, a pegada é... Bem, é a pegada! Tudo mundo sabe.
   Todos sabiam, exceto Thiago. Estragara tudo. Mediante as experiências anteriores de João Paulo, só havia uma coisa a fazer:
   - Seja carinhoso. Tente retomar a confiança que ela tinha. Depois, diga que ama ela e vá se desculpando aos poucos, acabou.

   Primeiro esse dia, seguido do amanhã, o depois deste e assim por diante. Carolina e Thiago ficaram três meses sem se falar.
   Não aguentando mais, Thiago expôs o motivo do delito cometido. Carolina dissera que começava a sentir algo por ele, Thiago ficou pasmo. Por que conversassem, não eram mais os mesmos, falavam como estranhos. Carolina, antes brincalhona só para com ele, estava fechada, só respondendo as perguntas (sem ir de encontro ao olhar do interlocutor). Thiago, antes expansivo e alegre, comentavam fatos de pouca importância do cotidiano entediante, agora, media as palavras (tinha medo de magoá-la).
   Passado algum tempo, foram retomando a amizade, assim como de início, bem como dissera João Paulo. Uma pena que semanas depois Carolina namorasse o primo dela, Adalberto: Sujeitinho magricela, incrivelmente míope, que não tinha coragem nem de pegar em sua mão, quanto mais beijá-la com feracidade... 


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