Segunda feira de manhã. Por volta das oito,
Carolina e Thiago estavam sentados, um ao lado do outro em frente ao
computador. Era muito comum ver esse quadro diariamente. Mesmo não sendo
irmãos, foram criados juntos e se conheciam há muito tempo, desde que usavam
fraldas. Tinham a mesma idade, quinze anos. Estudavam na mesma escola;
discutiam sobre os mesmos assuntos; frequentavam os mesmos lugares, apesar de
existir diversão adolescente em cidade de interior.
Estavam na casa de Thiago. Ele morava com os
pais e o irmão: A mãe estava na cozinha; seu pai na prefeitura. Trabalhava em
um cargo administrativo ao qual entrava prefeito, saia prefeito (o mesmo valia
aos funcionários, em cada gestão um batalhão novo) e ele permanecia, era um
funcionário exemplar; seu irmão tinha só quatro anos, devia brincar com seus
bonecos decapitados.
Mais tarde poderia chover e bastante, pois o
frio que fazia era extraordinário: Percebera que Carolina pedia agasalho. Ainda
estava nublado, ventando muito.
Em
todos esses anos Thiago nunca notara a proximidade que eles tinham. A distância
mínima das cadeiras, a risada de Carolina ao assistir o vídeo engraçadíssimo
que Thiago encontrara por acaso na internet. O braço dela roçara no seu, bem de
leve. Ele começava a ficar nervoso sem saber o porquê. A cabeça de Thiago
estava vazia, aérea, como se estivesse no quarto e ao mesmo tempo flutuando em
algum outro lugar, só assistindo a cena que se passava lá em baixo.
Nem
um casal de namorados se conhecia tão bem quanto eles. Um sabia os segredos do
outro, mesmo que fossem de nenhuma importância. Também, nunca reparara que
Carolina fosse bonita, talvez uma das mais bonitas que conhecia: Lábios
carnudos; nariz arrebitado; olhos doces, como mel; cabelos castanho-claros; timidez
de donzela; seu corpo, ainda estava amadurecendo, a infantilidade de sua voz e
gestos era clara.
Thiago, movido por um instinto
indistinguível que nascera com o momento, passou seu braço esquerdo em torno da
cintura de Carolina.
- O que foi? – Perguntou Carolina,
percebendo que seria abraçada.
- Nada... – Foi vaga e tímida resposta dada.
Sem mais questionar, ficaram nessa posição
durante alguns segundos. Continuando a investida, Thiago abraça Carolina com
mais força.
- O que você está fazendo? Está machucando!
– Tomara cuidado com o tom e altura que falava, não queria perturbar a mãe do
amigo.
Ele não respondera.
Fizera tudo isso de forma mecânica,
calculada como se tivesse lido algum passo a passo. Tinha um olhar sério no
rosto de quem está totalmente decidido a ir até o fim, só precisava seguir o
que planejara no dia anterior.
- Que brincadeira é essa? Você sabe que não gosto disso. – E ele sabia,
Carolina era muito tímida, tanto contato a deixava em pânico.
Sem mais espera, Thiago a beija. Ela
relutara. Fora tão rápido. Agora, ela é agarrada com os dois braços, braços
fortes os de Thiago. Não eram ósculos, literalmente Carolina era devorada. Como
gritar com a boca ocupada? Era a única resposta que ela desejava. Fora erguida
por Thiago que a abrigava a permanecer passiva. As suas mãos ferozes corriam em
busca dos seios ainda em desenvolvimento, porém apalpáveis.
Depois de saciado, ela a largou. Ela estava
com o rosto rubro; cabelo em desalinho; vestes rotas e semblante triste.
Parecia que ia chorar.
Ao perceber o que fizera, sentiu-se mal. Por
que agira com tanta brutalidade? De fato, nunca saíra de si como nesse momento.
Ambos se encaravam, calados. A única pergunta era por quê...
***
No
dia seguinte, na escola, Thiago conversava com João Paulo do segundo ano.
Garoto esperto, nem tanto nas atividades acadêmicas, mas na escola da vida.
Entendedor de muitas coisas, dentre elas, o coração feminino. Em uma conversa
com João Paulo, ele dissera o seguinte:
- Pra que a menina goste de você, antes você
tem que fazer com que ela goste. Mostrar o motivo certo.
Ouvia atento tudo que ele tinha a dizer. Um
boato antigo apontava João como o mais ‘fogoso’; ganhou esse título das
próprias meninas, do fundamental e médio. Era assim que era conhecido por elas,
‘fogoso’. Ele mesmo já disse que fora pego pelo marido da Professora Ângela
enquanto a mesma acariciava a sua região púbica.
Por esses e outros pormenores compunham a
reputação de João Paulo.
Mas afinal, mesmo com a ajuda desse
inexorável mestre na arte da conquista, por que falhara? Reproduziu mentalmente
casa passo dado no dia anterior e não achou explicação: Carolina tinha que ter
motivos para se apaixonar por ele, ou era o que deveria.
- Talvez você não tenha a pegada...
A pegada! Era evidente, a pegada! O que era
mesmo?
- Ora, a pegada é... Bem, é a pegada! Tudo
mundo sabe.
Todos sabiam, exceto Thiago. Estragara tudo.
Mediante as experiências anteriores de João Paulo, só havia uma coisa a fazer:
- Seja carinhoso. Tente retomar a confiança
que ela tinha. Depois, diga que ama ela e vá se desculpando aos poucos, acabou.
Primeiro esse dia, seguido do amanhã, o
depois deste e assim por diante. Carolina e Thiago ficaram três meses sem se
falar.
Não aguentando mais, Thiago expôs o motivo
do delito cometido. Carolina dissera que começava a sentir algo por ele, Thiago
ficou pasmo. Por que conversassem, não eram mais os mesmos, falavam como
estranhos. Carolina, antes brincalhona só para com ele, estava fechada, só
respondendo as perguntas (sem ir de encontro ao olhar do interlocutor). Thiago,
antes expansivo e alegre, comentavam fatos de pouca importância do cotidiano
entediante, agora, media as palavras (tinha medo de magoá-la).
Passado algum tempo, foram retomando a
amizade, assim como de início, bem como dissera João Paulo. Uma pena que
semanas depois Carolina namorasse o primo dela, Adalberto: Sujeitinho
magricela, incrivelmente míope, que não tinha coragem nem de pegar em sua mão,
quanto mais beijá-la com feracidade...
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