segunda-feira, 26 de maio de 2014

'Trem Noturno Para Lisboa'



          
Jeremy Irons no papel de Raimund Gregorius, é um solitário senhor suíço que leciona aulas de latim para o Ensino Médio, divorciado, o professor passa por momentos de profunda introspecção. Em um dia chuvoso, conhece uma moça portuguesa de uma maneira um tanto quanto inusitada, quando esta tenta dar cabe de sua vida pulando de uma ponte que fica a caminho da escola onde Raimund trabalha. 

Após esse encontro ele fica com um sobretudo vermelho da moça, em um dos bolsos está um livro ('Um Ourives das Palavras' de Amadeu do Prado) e uma passagem de trem para Lisboa, a partir desse momento esse senhor de vida pacata e solitária parte em busca de um mundo desconhecido e de uma vida almejada por si próprio, se vê participante de uma história de paixão, ódio e revolução, preenchendo assim totalmente sua existência até então vazia e sem sentido.


           O filme é baseado no livro de mesmo nome, escrito por Peter Bieri.



           Aclamado por muitos, odiado por outros o filme segue nas telonas do mundo inteiro, gerando amor e ódio, mas considero que vale uma ida ao cinema.

Trailer


segunda-feira, 19 de maio de 2014

'A Grande Beleza'

"Você não precisa levar nada a sério. exceto o menu, claro."
                                                                          Jep Gambardella 

                           Quem é Jep Gambardella?


Protagonista do filme 'A Grande Beleza' (do italiano: La grande bellezza), Jep Gambardella (Tony Servillo) é um escritor de 65 anos de idade, além de jornalista, membro da alta sociedade romana que entre suas festas e taças de vinho com amigos, sente necessidade de filosofar e consequentemente continuar suas obras literárias abandonadas desde a criação de 'O Aparato Mundando'. A personagem se utiliza de festas, sexo, conversas fúteis com seus amigos dentre eles uma editora, dono de uma boate, entre outros, para tentar preencher sua vida fútil e frívola, apresentando um olhar ora vazio e distante, ora espantado, Jep faz passeios rotineiros pela capital italiana, porém sem destino tal como sua vida, podendo ser destacados os momentos nos quais sonha com os olhos abertos quando se encontra deitado sobre sua cama a olhar o teto branco que segundo sua imaginação se transforma o mar, o que lhe remete à sua juventude, em uma dessas reflexões mastiga essas palavras: 

“Eu não posso perder mais nem um minuto fazendo coisas que não quero fazer”.

A partir desse momento Jep parte em uma jornada interna na busca pela sua própria identidade, desejando ardentemente escrever um novo livro, Jep se lembra constantemente de uma de suas namoradas o que o marca de maneira profunda, fazendo com que se sinta frágil e pequeno.

Opinião dos Críticos:

Conforme ocorre com a maioria dos filmes de Arte, 'A Grande Beleza' foi recebido com 'pedradas', segundo Marcelo Janot:
‘A Grande Beleza’ “funciona muito bem em dois níveis: como uma crônica da solidão de um homem que não consegue encontrar seu lugar no mundo que o cerca, tema recorrente na obra de Sorrentino, e a observação ácida e crítica desse mundo, que é a Roma contemporânea”. Janot ainda critica Sorrentino comparando-o com Federico Fellini, diretor do filme ‘A Doce Vida’: “Se o diretor teve a pretensão de tentar chegar aos pés de Fellini recorrendo ao onírico e ao mundano colocando em cena uma girafa de circo, flamingos ou a ex-musa Serena Grandi como uma espécie de Saraghina cheiradora, são momentos que não conseguem atingir uma beleza que ultrapasse o artificialismo da mera plasticidade. (…) não há em Sorrentino um pingo da genialidade de Fellini”, diz.
Segundo Thales de Menezes: 
Vale a pena assitir o filme novamente no semana (concordo!). 
“É apropriada a comparação com o Antonioni de “A Noite” e, principalmente, o Fellini de “A Doce Vida”. A jornada hedonista de Jep Gambardella, escritor de um único e elogiado livro e repórter cínico de revista esnobe, poderia ser protagonizada por um Marcello Mastroianni (1924-1996). Mas Toni Servillo, ator de 54 anos interpretando alguém de 65, é uma das razões do sucesso do longa. Acompanhá-lo em seu balanço da vida mundana fascina, mas a empatia do público com ele pode ofuscar uma segunda e importante leitura do filme”, escreve o crítico. “É possível isolar os episódios em que Gambardella assiste a performances de artistas “modernos” e os entrevista. O que se vê é uma sucessão de embates entre a ironia inteligente do escritor e o vazio de simulacros de arte”, finaliza.

Prêmios:

  • European Film Awards de 2013 - categorias: filme, diretor (Paolo Sorrentino) e ator (Tony Servillo). 
  • Oscar - Melhor Filme Estrangeiro - Paolo Sorrentino
  • Globo de Ouro - Melhor Filme Estrangeiro - Paolo Sorrentino
  • Silver Ribbon Awards - Melhor Ator Coadjuvante - Carlo Verdone
  • Silver Ribbon Awards - Melhor Atriz Coadjuvante - Sabrina Ferilli
  • Silver Ribbon Awards - Melhor Fotografia - Luca Bigazzi
  • Melhor Som - Emanuele Cecere
  • Globo d'oro - Melhor Fotografia - Luca Bigazzi
  • 34th Boston Society of Film Critics Awards - Melhor Filme Estrangeiro Paolo Sorrentino
  • Prêmios do Cinema Europeu - Melhor Filme - Paolo Sorrentino 
  • Melhor Diretor - Paolo Sorrentino
  • Melhor Ator - Toni Servillo
  • Melhor Editor - Cristiano Travaglioli
  • Hollywood Film Awards - Melhor Filme Internacional - Paolo Sorrentino
  • Melhor Filme Independente - Paolo Sorrentino
  • Melhor Novo Roteiro - Paolo Sorrentino and Umberto Contarello
  • Tallinn Black Nights Film Festival - Grand Prix - Paolo Sorrentino
  • Juri Prix - Luca Bigazzi 

Créditos e Agradecimentos:



sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

O Bola Murcha

 


   Jorginho sofrera um acidente que o levara ao hospital, ano passado. Ele jogava futebol na rua de frente a sua escola, em um sábado de tarde, quando Zé Bento, dono do supermercado “Brasileiríssimo”, o atropelou. O caso foi parar na justiça; os pais furiosos do menino esperavam uma indenização, toda via a pena do réu foi branda: Custear o tratamento de Jorginho e serviço comunitário – esta última pena fora revertida a uma cadeira de rodas que seria entregue a alguém da comunidade, ideia do promotor.
   Desde então, a direção da escola de Jorginho (Escola Estadual de Ensino Fundamental Médio Professor Ferreira Lima) deixa, com um aluno responsável, as chaves do ginásio poliesportivo para que os meninos pudessem brincar (com segurança!) um pouco nos fins de semana. A vice-diretora, dona Marisa, organizara uma grade de horários, estipulando o horário que cada turma poderia usar a quadra. Nas primeiras semanas houve confusões, mas depois se adequaram às novas regras.
   A alegria da criançada foi grande quando souberam que poderiam brincar no ginásio. Todos se comportaram e se reuniram para criar uma grade de horários que se adequasse a todas as turmas. Os monitores foram escolhidos após muita discussão e reflexão (comumente, os eleitos eram os mais velhos ou fortes das salas), com exceção da turma a da sexta série que teve o primeiro monitor eleito da escola, Jorginho. Sempre alegre por ter sido escolhido, tamanha a honraria.

   Numa tarde de sábado, uma turma vai crescendo pouco a pouco conforme vão andando pelas tranquilas ruas de uma cidadezinha de interior. Um a um, molecotes afoitos vão integrando a caravana que segue sem parar. Barulho maior que a algazarra feita pelo grupo é a de uma moto velha que passa por eles, soltando pipocos e uma fumaça escura pelo escapamento.
   As vestes eram parecidas: bermudas; camisas sem mangas, já muito gastas e surradas; uns de sandálias, outros de tênis – estando a maioria descalça.
   Os moleques berravam, xingavam-se entre si, enfim, eram crianças. Porém, o único que era bem tratado era Murilo, o dono da bola.
   A molecada chegou ao ginásio. Quem tem relógio?
   – Eu tenho! – Erguera-se Rapozinha. – Duas e meia!
   A turma da quinta série ainda ocupava a quadra. Lucas se aproximou do juiz e disse:
   – Podem parar. Estão tomando a nossa hora.
   – Que hora? – Indagou o responsável da quinta série.
   – Que hora? (tá se fazendo de doido?) A hora de vocês irem embora! Fora!
   Trocaram alguns gritos, mas não demoraram. A quadra estava livre.
   A turma da sétima série tinha das 2h 30m horas da tarde às 4h 30m de puro futsal.
   As arquibancadas estavam cheias de garotas, de diferentes idades, para assistir a partida. Algumas saiam, chegavam. Irmãs, namoradas e simples amigas assistiam os jogos.
   Raposinha era o responsável, portanto, escolhia os capitães. Os eleitos da semana foram Vitor e Murilo que montavam seus times. O time de Murilo era formado por Gegê, Igor, Bil Coxinha e Josicleiton, os ‘sem camisa’. O time de Vitor era formado por Besinho, Lucas, Coração e Peida Fogo.
   Os que eram chamados por apelidos, por certo tinham histórias singularíssimas que explicavam. Por exemplo: Gegê (Abraão) costumava vestir camisas maiores que o corpo, o motivo era simples, usava as roupas velhas do irmão mais velho. A mãe de Bil Coxinha (Emílio) tinha um fiteiro na rua da frente que vendia coisas diversas, inclusive coxinhas. Besinho (Bernardo) escrevia seu nome com letra minúscula, sempre, mesmo agora, com 13 anos. Coração (Sérgio), criado pela tia, irmã mais nova da mãe, e não gostava que ele saísse para brincar na rua; sempre que este saia, a tia advertia “tenha cuidado, Coração”. Peida Fogo (Ivisson) no recreio da escola estava brincando de pega-pega quando parou para amarrar os cadarços do sapato; ao se abaixar, as calças se rasgaram e Igor, que estava ao seu lado, jura de pé junto que o rasgão foi causado por uma flatulência violenta.
   O jogo começou. Cada um assumiu sua posição. Murilo e Vitor eram atacantes; Gegê e Besinho eram volantes; Igor e Lucas eram os goleiros; Bil Coxinha, Josicleiton, Coração e Peida Fogo eram zagueiros.
   Josicleiton olhou rapidamente para cima. “tem meninas aqui”, pensou. Só viera por elas. Este, era moreno; seu rosto denotava lerdeza e preguiça; quando raramente falava, dizia besteiras inconcebíveis, gostava de se fazer de besta perguntando várias vezes o óbvio; de 1m e 70 cm de altura; pesando uns 55 kg; os amigos da escola o ouviam.
   No futebol ele era horrível, bastava pouco tempo de jogo para perceberem que a figura que mal se mexia em campo era inútil; girava o corpo tentando acompanhar com os olhos a bola, que seguia há metros de distância. Nos instantes em que a bola estava em seus pés, chutava de sem pensar; para quem? Para fora, qualquer lado. Nem avançar arriscava, chutava sempre.
   Quem teve a maior posse de bola da partida foi Vitor. Magro; alto; da mesma idade que Josicleiton – igualmente moreno, porém ligeiro e esperto. Marcou dois gols naquele dia.
   O placar estava cinco para os de camisa e três pros sem. Ao perceber que Josicleiton atrapalhava mais que ajudava, os sem camisa desanimaram.
   – Ei, Murilo. Vamos tirar o esse daí. – Dissera Bil Coxinha.
   – Pode não, assim o time fica incompleto. – Dissuadira Vitor.
   – Fica 'descompleto' mesmo. – Replicara Murilo.
   – Nada. Não fica certo. – Finalizara Vitor, que corria para a zaga para evitar o avança de Coxinha.
   Alcançara Bil, infelizmente chocaram-se os corpos e os dois, caindo.
   – Pênalti! – Anunciara Raposinha. O juiz do jogo.
   – É roubo! Isso é roubo! – Gritava Gegê, aproximando-se de Raposinha.
   – Roubo? Quem vai bater é o teu time, besta! – Explicara o juiz.
   Igor bateu o pênalti e marcou um gol.
   A partida acabara. Eram 4h e 30m, rapazes que marcaram essa hora ocupavam a quadra enquanto os meninos saiam. Cinco para os com camisa e quatro para os sem. A grande revanche estava marcada para a semana que vem.

   Ainda nas arquibancadas, as garotas permaneciam sentadas. Os garotos que jogaram a partida foram conversar com elas, só Josicleiton permanecia distante.
   – Ó, aquela ali tava olhando pra você durante o jogo. – Indicara Vitor ao colega.
   Ao perceber que olhavam em sua direção a menina virou o rosto e direcionou sua atenção a outro ponto da quadra. Era uma garota bonitinha, de grandes olhos negros, da idade dos meninos apresentados na página anterior. Estava de saias jeans, blusa com estampa florida, usava uma tiara branca com pequenas pedras que imitavam pérolas e alpercatas.
   – Você conhece? – Perguntara baixinho Josicleiton.
   – Nunca vi. Fala com ela.
   Josicleiton hesitou.
   – O que foi?
   – Nada.
   Dito isso, o garoto subiu até onde a menina de tiara de pérolas estava sentada.
   Pouco tempo depois, cerca de cinco minutos, ele saia da quadra.
   – Ei, qual é o nome dela? – Aproximara-se Vitor.
   – O nome? Não sei.
   – E o que foi que vocês conversaram.
   – Sobre o jogo.
   – Que isso, volta lá! Fala direito com ela.
   – Tá bom! Pára! Eu já conversei!
   Vitor pegou no braço de Josicleiton e tentou arrastá-lo de volta para dentro da quadra. No segundo passo, Vitor largou o colega.
   – O que tem de mais em conversar com a menina?
   – Eu chamei ela pra passear comigo, mas ela estava esperando Wilker...
   Ao perceber que o amigo na verdade fora rejeitado, Vitor parou de insistir. Por um ínfimo instante, este sentiu pena de Josicleiton que estava visivelmente constrangido.  Conversaram um pouco. Depois, despediram-se.


***


   No sábado seguinte, os já conhecidos garotos combinaram ir para a panificadora Real a fim de lancharem após a tarde de jogo.
   Enquanto o grupo de molecotes descia a rua principal, dobrando a esquina da Praça da Liberdade, Vitor falou a Josicleiton:
   – Lembra da menina da semana passada?
   – Que tem ela? – Indagara baixinho, com medo que os outros escutassem.
   – Sei o nome, é Márcia.
   – Hum...
   – Sabe como eu descobri? – A voz de Vitor tornava-se cada vez mais firme a cada sílaba.
   Josicleiton não perguntara.
   – Foi Andreza quem me disse. Andreza é a irmã mais velha dela (Márcia). – Esta era uma colega de classe dos meninos.
   – Sabe o que mais eu descobri? – Josicleiton virara o rosto para desviar seus olhos dos de Vitor.
   – Ela não esperava por Wilker coisa nenhuma!
   – Esperava sim!
   – Pra que mentir?
   Outra vez Josicleiton se calou e virou o rosto. Findou-se o diálogo.

   Ao chegarem à padaria, todos dividiam os gastos: dois reais por cabeça. Comprariam pães doces; pequenos bolos baetas; leite achocolatado para uns, refrigerante para outros. Só um se impôs a pagar a taxa imposta pela turma:
   – Bora, Josicleiton! Poxa! – Tentara convencer Raposinha, o mais persuasivo dentre eles.
   – Tô sem dinheiro.
   – Mentira. Mentira que eu vi seu pai te dando uma nota de cinco! Fui eu quem te chamou na porta de casa. – Dissera Besinho.
   Josicleiton emudecera.
   – Vamos, todo mundo tá contribuindo. Desse jeito você fica sem lanchar! – Afirmara Coração.
   – Ouvi histórias da pirangagem desse aí, só faltava mesmo ver. – Murilo apontava energicamente, com raiva, em direção de Josicleiton.
   – Tá certo, eu pago, mas só tenho um real. O resto pago depois. – Expusera a seguinte alternativa.
   – Deixa disso e paga logo, oh! – Impacientara-se Peida Fogo.
   Nesse momento, ia passando algumas garotas. Dentre elas, podia-se ver Márcia (estavam na outra calçada, do outro lado da rua).
   – Josicleiton, sabe quem está ali – Vitor apontou em direção das meninas. – Se você não der o dinheiro, eu vou chamar!
   Os outros ignoravam o significado da ameaça. A expressão de Josicleiton era a mesma, inabalável, vazia.
   – Ô Márcia!!! Mááárrciiaaa!!!
   A garota olhou. Inocente, ia em direção dos meninos que a chamavam.
   Para surpresa de todos, Josicleiton cedeu.
   – Pronto! Pronto!!! Olha aqui o dinheiro, só não grite mais. – Entregara às pressas os dois reais.
   Márcia chegou e perguntou “O que foi?”. Vitor respondeu que Josicleiton queria falar com ela. Os meninos entenderam e os deixaram a sós. O encabulamento de Márcia se igualava ao de Josicleiton. De qualquer forma, o resto da tarde findara-se com uma empolgante conversa. Depois, ela disse que ficava escuro e tinha de voltar para casa; ele a acompanhou até a casa.

   Os sábados seguintes continuavam sem nada de extraordinário naquela cidadezinha pacata: Josicleiton corria atrás da bola na quadra de futsal; Márcia o assistia toda semana, a única diferença eram os encontros desses dois namorados todos os sábados, no mesmo banco da Praça da Liberdade.

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Palavras - James Dean


''De todas as palavras faladas ou escritas. As mais tristes são estas: 'Poderia ter sido.'' (James Dean - Eternamente Jovem)

sábado, 23 de novembro de 2013

Mente livre




"Deixe sua mente vagar em simplicidade, misturar o seu espírito com a vastidão, seguir junto com as coisas como elas são, e não fazer nenhum espaço para opiniões pessoais, então o mundo será governado."

Chuang-Tzu

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

A verdade por trás da Sociedade Secreta "Mão Negra"



     A  Mão Negra também conhecida como Unificação ou Morte (Уједињење или смрт, Ujedinjenje ili mrt*) era uma organização nacionalista  originada na sérvia que se valia do terrorismo como forma de exercer atividade política e tinha ligações com alguns elementos pan-eslavistas (movimento político e sociocultural do século XIX, que buscava a união de todos os povos eslavos) do governo sérvio.
           


                                     Fundação:

       Fundada no Reino da Sérvia em em 10 de junho de 1910, por ex-membros de uma sociedade semi-secreta chamada Narodna Odbrana ("Defesa do Povo"), dedicado à realização do pan-eslavismo e do nacionalismo, através de assassinatos




Principais Atos:


Foram os responsáveis que planejaram o 
assassinato do herdeiro do trono do Império Austro-Húngaro, o arquiduque Francisco Ferdinando da Áustria e sua esposa Sofia Chotek, em Sarajevo, Gavrilo Princip desferiu os tiros que mataram o arquiduque, esse que poderia ser um fato isolado na História, ocasionou o Ultimato de julho, que levaria, poucas semanas depois, à eclosão da Primeira Guerra Mundial. Gavrilo foi preso, morto após quatro anos,por causa de uma tuberculose em um campo de refugiados na República Tcheca (atualmente tchecoslováquia).


A Sangue Frio:

Zelavam pela obediência dos seus membros e exigiam a execução dos seus inimigos. Um dos principais membros foi Dragutin Dimitrijević "Apis", um dos conspiradores do Golpe de Maio de 1903 (rei da Sérvia Alexandre Obrenović e sua esposa, a rainha Draga, foram assassinados dentro do Palácio Real em Belgrado). A Mão Negra foi herdeira deste conluio que acabou com a dinastia Obrenović ao assassinar o rei Alexandre I da Sérvia e a rainha Draga Mašin; e perpetuou o poder dos conspiradores na vida política do país, com consequências desastrosas dentre delas o aumento do poder dos conspiradores na corte, no parlamento e nos vários governos no início do século XX

Extinção:

A Mão Negra teve seu fim decreto em 1917 pelo Governo da Sérvia após o julgamento de Salônica. 

Curiosidade:

Foi a primeira organização terrorista no mundo.


quarta-feira, 20 de novembro de 2013

"Saudade"


"Quando se ouve boa música fica-se com saudade de algo que nunca se teve e nunca se terá."
 Samuel Howe

Para uma mulher especial que nunca tive e espero ter um dia.

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Prisão segundo Michel Foucault (filósofo francês)


Este é um trabalho acadêmico que fiz juntamente com alguns colegas meus, vou disponibilizar aqui para os senhores, um "resumo" do que Foucault diz  sobre sistema carcerário e suplício desde a Idade Média até os dias atuais (anos 50 - ano em que foi escrita sua obra "Vigiar e Punir").

O Direito de punir parece ser uma ideia natural. Vários estudiosos analisaram tal direito, sendo um estudioso proeminente, Michel Foucault.
A descrição histórica do poder de punir está intimamente ligada a prisão, onde a permuta entre o sofrimento corporal medieval e o tempo perdido de vida em prisões capitalistas da modernidade é verificado. O poder de punir é utilizado de forma política, de modo que o suplício do corpo ao sofrer a pena é um espetáculo aterrorizante. O “Processo” medieval era secreto, sem chance de defesa para o réu, que era questionado sob tortura, ao passo que a execução penal era pública. Uma forma de dominar o povo pelo medo. Juarez Cirino dos Santos, historiador, afirma que “o objeto da pena criminal é o corpo do condenado, mas o objetivo da pena criminal é a massa do povo, convocado para testemunhar a vitória do soberano sobre o criminoso, o rebelde que ousou desafiar o poder”. 



Foucault abandona eventuais aspectos negativos da repressão a criminalidade e verifica o lado positivo, “como tática política de dominação orientada pelo saber científico”. Aqui o sistema punitivo seria um subsistema social garantidor do sistema de produção da vida material, onde a punição auxilia uma economia política do corpo para criar docilidade e extrair utilidade das forças corporais. O corpo poderia ser entendido como poder produtivo. 
A obra trata também de estratégia das classes dominantes para produzir a legitimação do poder sobre os indivíduos. Nota-se um paralelo entre prisão moderna como “show” feudal de punição, onde a posição de certos membros da sociedade em sua hierarquia de poder aceitam as normas e as práticas da punição. Parece que o povo aceita, de algum modo, ser dominado. Percebe-se também que o sistema penal gerencia a criminalidade, em vez de exterminá-la. 

Do ponto de vista disciplinar, a prisão era mal vista na época feudal devido aos custos e ociosidade dos presos. Seria no mínimo estranho aceitar sem questionamentos como na sociedade atual, onde o capitalismo impera, as prisões. A própria estrutura do poder, instituída para controle e sujeição do corpo do indivíduo com o objetivo de torna-lo dócil e útil, ensinado o prisioneiro a fazer o que queremos e a operar como queremos, pode ser uma boa resposta. A dissociação corpo (capacidade produtiva) da mente (vontade pessoal) é assim desejada. A disciplina é imposta por métodos de adestramento dos corpos, via controle e recompensa. 

Percebemos que ao punir, ceifamos do indivíduo o seu tempo livre, que geralmente é tido como o bem mais geral das sociedades atuais. Este é um dos aparelhos técnico- disciplinares construídos para produzir a docilidade e utilidade mediante exercício de coação educativa total sobre o condenado. 


Para muitos crimes, a prisão poderia ser um último recurso. Mas ela tem sido utilizada muitas vezes para tirar do convívio social pessoas que por ventura possam ser enquadradas como perigosas, mantendo tal indivíduo à margem do convívio social. É importante que, em casos como esse, a pessoa presa deveria receber efetivo auxilio por parte da instituição que detém sua custódia a fim de socializá-lo de modo efetivo e volte a sociedade livre apto a trabalhar, estudar, produzir e conviver em harmonia com as demais pessoas. 

                            Finalidades das penas: 

  • Reparação do mal causado pelo criminoso; 
  • A prevenção da prática de novos delitos; 
  • Inibir ações criminosas; 
  • Transformar o preso de criminoso em não criminoso (ressocializado). 


                                                       Opinião pessoal: 

Entendemos que prisão por longo tempo é nociva ao preso; ele não seria mais capaz, ou dificilmente, de voltar ao convívio social de modo satisfatório, dado o seu empenho, por grande parte da sua vida, em suportar condições internas do presídio, extremamente desumanas. O tempo excessivo de prisão pode trazer melancolia, depressão, psicose etc.
Foucault confronta aspectos negativos da prisão (aplicação das leis penais) com os positivos (táticas de dominação política) com a moderna tecnologia de punir. Percebe o sistema punitivo como um subsistema social, onde a prática de punir está associada a uma “política corporal” para criar a docilidade e extrair alguma utilidade das forças do corpo humano, através de força submetida, por intermédio de poder político sobre o poder econômico do corpo. 

O Binômio “poder/saber” é observado. Percebe-se uma gradual substituição da punição tipo “sistema feudal” para punição tipo “sistema capitalista”.
Para Foucault, prisão é a forma de aparelho disciplinar do modelo panótico, construído para exercício do poder de punir mediante supressão do tempo livre, tido como o bem jurídico mais geral das sociedades modernas.

Os homens de sucesso de hoje seriam aqueles bem sucedidos em suas carreiras, bem resolvidos emocionalmente em aspectos sexuais, familiares e de bom convívio social, mas também aquele capaz de desfrutar as boas coisas da vida, de lazer, cultura, esportes. Uma pessoa de sucesso é aquela que tem tempo livre para desfrutar as boas coisas da vida. 

Nesse sentido, a prisão é um aparelho jurídico-econômico que cobra a dívida do crime em tempo de liberdade suprimida. É ainda um aparelho técnico-disciplinar construído para aprimorar multiplicidades humanas mediante exercício de coação educativa total sobre o condenado, gerando a redução da força política deles (corpos dóceis) e ampliação da força útil (corpos úteis) dos sujeitos condenados. 

Historicamente falando, a prisão (local de cumprimento de penas privativas de liberdade) e de execução do projeto de ressocialização de indivíduos condenados (produção de sujeitos dóceis e úteis) é antiga e vem fracassando, sendo revistas sempre. Mas continua com mais fracassos, reformas, e novos fracassos. 

A eficácia das prisões é no mínimo duvidosa, visto que em vez de reduzir a criminalidade, introduz os condenados em carreiras criminosas. 

Foucault verifica com distinção os objetivos ideológicos e dos objetivos reais do sistema carcerário: 
  • Objetivos ideológicos: repressão e redução da criminalidade; 
  • Objetivos reais da prisão: repressão seletiva da criminalidade, como tática política de submissão. 

A prisão deve ser um aparelho disciplinar exaustivo nos aspectos do indivíduo, como seu treinamento físico, desenvolvendo suas qualificações para o trabalho, comportamental, moral etc. É uma instituição completa, mais que a escola, oficina ou o exército e sua ação sobre o indivíduo deve ser ininterrupta. 
Créditos: Ulisses Torraga Miranda Bruno

A prisão dispõe de poder quase total sobre os detentos, numa espécie de despotismo, onde se verifica a regulação do homem em tempo integral (sono, lazer, fome etc.) pelo governo. 
Foucault acredita que a prisão é de fato muito diferente do conceito imaginado pelos pensadores. Um desses aspectos é que a prisão não forme, a partir dos malfeitores que reúne uma população homogênea e solidária (vemos que não é bem isso o que acontece). Percebemos a formação de facções criminosas em presídios.

Créditos:
Fabio Roberto de Oliveira Lessa 
Luccas Fernandes

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Love Kills



   Saí triste da festa. Acho que ninguém notou minha ausência.
   Que fiquem lá com aquelas fantasias bestas, sem graça. Não sei por que resolvi dar as caras se nem convidado eu fui. Aliás, Marcelo recebeu o convide e me convidou, consequentemente. Nem como convidado, mas convidado do convidado... Provavelmente, nenhum convidado convidou amigo, conhecido ou familiar para a festa.
   Perguntei a Marcelo de quem era a festa, ele me disse que era de sua prima, Fernanda. Não me falara sobre ela antes. Conheci seus pais, já parentes distantes eram completamente estranhos para mim.
   Na nossa sala todos parecem zumbis, desconfiados. Nunca abrem a boca para falar uma frase inteira em voz alta, geralmente à surdina. Mania estranha para adolescentes. A maioria não se conhece pelo simples fato da sala ser cursinho intensivo. Quatro meses é pouco tempo para criar vínculos com um completo estranho. Sempre gostei de conversar; sem dar confiança, intimidade; conversar é sempre proveitoso. Só Marcelo parecia não ter o rabo preso, assim a nossa relação se estreitou e viramos amigos fora de aula.
   Eu era (ainda sou) alto, devia ter 1 m 92 cm de altura; pesava algo na casa dos 80 quilos na casa; era vexado e enérgico quando conversava, provocando risadas quase que sempre; apesar de ser expansivo sempre fui tímido quando se tratava de certos assuntos. Tinha 18 anos
   Marcelo era também alto, assim como eu; por volta de 5 quilos mais pesado que eu, longe de ser gordo; sempre calmo; tinha o estranho hábito de transpirar mesmo na fria sala de cursinho, nunca se queixara de calor. Falávamos sobre coisas diversas dentro e fora da aula. Tencionava fazer economia política. Passara. Continuamos a nos encontrar quando já cursávamos a universidade. Tinha 19 anos.
   Como era fim de outubro, o tema da festa foi o Halloween, tive que ir a caráter. Aluguei uma fantasia ridícula de pirata – a fantasia vinha com muitos adereços e brilho, extravagante demais –. Fui com o ‘Super-homem’ ao local indicado no convite (até que a fantasia de Marcelo não estava das piores, se maneirasse no gel estaria perfeito; a capa vermelha o incomodava).
   Chegamos à festa. Os fantasiados estavam indiferentes, igual à sala do cursinho. Fora alugada uma espécie de clube, anfiteatro, com bastante espaço. Apesar da música, do ambiente grande e mal iluminado ­ – propício a uns amassos –, todos mudos. Tentei me aproximar, puxar xaveco com uma ‘vampira’. Parecia que atuava, brincava com a indumentária tentando parecer uma criatura da noite (vestido negro, obvio, de tecido fino, dando nas vistas seus contornos e formas), mas logo percebi que só me ignorava. Sem motivo algum – creio eu – ela me ignorou. Sem nenhuma amiga, conhecida ou acompanhante (talvez a anfitriã Fernanda fosse sua única conhecida) e mesmo assim, ela me ignorou. Acredito que ela não tinha nenhum amigo ali, pois se o tivesse já estaria conversando. Na realidade, as fantasias deviam atrapalhar mais que ajudar, afinal ninguém, pensa em falar com um Mickey Mouse ou um Sanduíche (um pirata é tão impopular quanto os citados).                          
   Fui apresentado à Fernanda. A garota mais chata da festa; belíssima, contudo: pouco receptiva para uma anfitriã. Sua fantasia Penélope Charmosa lhe caíra muito bem (devia ser essa a razão que levava Marcelo a correr atrás da priminha durante todo esse tempo). Já estava acostumado a ser abandonado enquanto falava só que dessa vez nem o diálogo me foi concebido! Bastou que olhasse em minha direção com desdém; perguntou a Marcelo “Quem é esse?” ele responde “Esse é Guilherme, um amigo meu.” Ela pergunta mais uma vez “E por que você convidou ele?”. Suspirou – gesto de descontentamento, presumi – e saiu para outro extremo da festa. Marcelo foi atrás (fizera-se papel de auxiliar o resto da noite).
   Passado alguns minutos deixei a festa. Pensando melhor, não era tristeza o que sentia; estava contrariado comigo mesmo por ter ido à festa. Desperdicei uma noite inteira.
   Andar fantasiado foi esquisito. Parecia que não houve festas de Halloween naquele bairro, naquela noite. Os transeuntes deviam me ignorar, deviam reparar as minhas roupas. Sentia-me desconfortável.
   A noite estava escura. Devia ser 23h00min horas, era tão cedo. Nenhuma estrela no céu. Estava longe de casa. Caminhei até um ponto de ônibus... Se bem que não conhecia o bairro, menos ainda um ponto de ônibus. Chegara à festa no carro de Marcelo; agora, procurava um meio de voltar.
   Adiante, vi uma figura curiosa: Estava vestindo uma roupa fina de hospital, dessas que os doentes em alas de observação comumente usam; tinha a cabeça fixa no chão; cabelo curto; descalça. Deduzi que se tratava de uma garota que saíra de uma festa de Halloween e, assim como eu, fantasiada.  Aproximei-me.
   – Boa noite. – Ao nosso redor, parecia que nada mais além de nós existia. A rua estava deserta.
   Sem resposta.
   Sem esperar uma réplica, perguntei:
   – Sabe onde fica algum ponto de ônibus por aqui?
   Sem resposta, de novo.
   Senti-me assustado: a posição da garota era a mesma do parágrafo em que introduzi a descrição. Feito uma estátua-viva. Digo viva, visto que apesar da palidez da pele estar tom de cera, ela era uma pessoa.
   – Você está bem? – Perguntei tentando me aproximar dela, talvez fosse só tímida. Falei com a voz baixa, branda.
   – Sim. – A resposta fora seca e breve. Continuava a olhar para baixo.
   Definitivamente, deixar uma menina como aquela no meio do nada seria absurdo. Mas o que fazer? Ela falou sim e nem os meus olhos a atingiam. Convencê-la de que precisa de ajuda seria dificílimo.
   – Aconteceu alguma coisa? Sente dores? Seja sincera, posso chamar uma ambulância e vamos para o hospital mais próximo...
   – Não! Já disse antes que “Sim”. – Gritara furiosa.
   Fiquei confuso. Ela tremia. Toquei o seu braço e disse amigavelmente:
   – Calma. Se você não quer, entendo. Onde fica sua casa?
   Nada respondera, só levantara a cabeça. Nesse instante vi seu rosto. Seu semblante era de alguém profundamente abalado; estava chorando e seus olhos estavam roxos de inchados (eles eram castanhos); estava magra; mesmo no escuro percebi que cortes e arranhões recentes que cobriam toda a região da mão ao cotovelo.
   – Quem fez isso? – Indiquei as marcas de seu braço.
   – Foi um homem... – Agora, estava apta a falar. Diferente de antes, respondia com calma. “Devia estar sob o choque de um trauma, isso deve explica”, pensei.
   – Mas que homem? Foi seu pai?
   – Amigo dele.
   Segurei na sua mão, olhei em seus olhos e continuei o interrogatório:
   – E você não disse nada para seu pai?
   – Esse homem foi pago por meu pai para fazer isso.
   Estremeci.
   – Vamos para a delegacia, ou melhor, temos que ir para um hospital. Já!
   – Não! Eu não quero.
   Ela me olhava no fundo de meus olhos. Estranhamente tudo aquilo parecia ser alheio, estranho para ela. Intrigava-me cada vez mais com as suas respostas.
   – Como é que eu vou te ajudar?
   Ficou calada durante poucos segundos
   – Me leve para casa.
   A maneira que ela usara para dizer “Me leve para casa” foi apavorante.
   Para minha casa? Para a casa dela.
   Estava um instante, calada, relutante, agora desejava minha companhia. Será que fui persuasivo a ponto de merecer a sua confiança? “Me leve para casa”. Ela disse que não era longe. Decidi que iria acompanha-la.


***


   Seu nome era Ângela, foi tudo o que revelara no caminho até sua casa.
   A caminhada durou uns vinte minutos. Engolidos pelo escuro da noite, convenci-me que andávamos para lugar nenhum. Arrisquei algumas perguntas, mas nos primeiros instantes só obtivera silêncio como resposta – queria que ela me visse como o amigo que realmente era –. Depois, respondia timidamente. Era um progresso, de certa maneira.
   Na caminhada perguntara “Com quem mora?”, nada me respondera. Agora percebo que as suas poucas respostas foram inúteis, de nada revelava quem era a misteriosa adolescente, só serviram para um papo casual.
   Ângela estava sem chaves – pegara um molho da terra de uma avenca do lado esquerdo da porta –. Finalmente entramos em sua casa. Relativamente pequena, como não explorei todos os cômodos, então não dizer com certeza se era pequena; classifiquei como confortável para uma única pessoa morar; então, era uma casa grande.
   Ao acender a sala, sondei rapidamente o ambiente em que me encontrava: decorado com móveis velhos – longe de antiguidades, só feios e gastos – de cores sóbrias, porém desbotados (esse era o aspecto do jogo de sofás); a televisão era dessas de catracas, impressionaria se funcionasse. Do centro da sala, onde estava, podia ver um corredor estreito que dava para a cozinha; no meio do corredor, uma porta que dava para um cômodo, provavelmente o banheiro e uma porta no lado oposto que pensei ser um quarto.
   – Você está com sede? Aceita um copo d’água? – Perguntara alegre e jovial.
   – Sim, obrigado. – Na sala de Ângela, a vontade de falar desapareceu completamente.
   Ela entrou na cozinha e voltou com um copo de água. Continuava em pé.
   – Aqui.
   Bebi a água em grandes goladas. Deixei o copo no braço do sofá de dois lugares.
   Voltando a atenção à anfitriã, percebi que mais uma vez seu semblante mudara. Da extrema tristeza, agressividade e solidão para uma figura dócil ainda que muito tímida para uma menina alegre e sorridente que se jogara ao meu pescoço e reclamava um abraço apertado.
   – O que houve?! – Indaguei impressionado.
   – Nada. É que agora sei que tenho você comigo e nada de ruim irá acontecer.
  Com essa resposta, tive pena dela. Afinal, eu era um estranho e provavelmente uma das poucas pessoas que conhecera na vida que tiveram compaixão por um ser tão pobre.
   – Claro, eu te prometo: nada de mal vai te acontecer. – Respondi da mesma forma que procedera desde o nosso encontro: calma e pausadamente.
   – Sabe? eu gosto de você, Guilherme... Você é boo... om. – Sem largar meu pescoço, soletrava essas palavras à surdina, num cochicho.
   De repente, senti um calafrio, talvez calafrio fosse uma palavra inadequada. O termo correto... Nunca encontrei a palavra que descrevesse a sensação.
   – Minha cabeça dói.
   – Do que precisa?
   – Só deitar um pouco. – Beijara meu rosto ao termino do “pouco”. Lentamente caminhou para o quarto. O andar mudara igualmente como sua fala e modos; Ângela caminhava em nuvens, flutuando em direção à cama.
   Poderia ser mais sério. Entrei no quarto com a intenção de perguntar o que realmente ela sentia.
   O quarto estava escuro. À meia-luz que vinha da janela, vi havia uma grande cama de aço, um criado-mudo com alguns frascos abertos, um pequeno guarda-roupa, e Ângela deitada na cama (sem travesseiros ou lençóis). Seus olhos penetravam minha alma.
   – Tem problemas para dormir, Guilherme?
   – Durmo como uma pedra.
   – Então você é um inocente.
   – Por que diz isso?
   – Só os inocentes é que dormem. “Dormiu como um inocente”.
   – Acho que os inocentes dormem melhor. Outros dormem mesmo sem o ser.
   – Antes, bastava me deitar para dormir; hoje, nada me faz dormir. – Abaixara a voz, falara com tom amargo, seco. O que ela queria dizer com isso?
   – Deite aqui – Indicou com a mão direita onde eu devia me deitar.
   Obedeci. Parece que há muito tempo que só sigo seus paços.
   – Assim, quem sabe eu durmo.
   – Quer que eu pegue um copo de água? Para que você possa tomar uma dessas pílulas...
   – Não servem para dores de cabeça! – Berrara subitamente.
   Assustei-me.
   – Desculpe... Você falou como meu pai... Prefiro que fale como você... – Sua explicação era entrecortada.
  – Prefiro que nada fale.
  Nesse instante, perdi a fala. Fiquei paralisado, petrificado.
  Ângela me abraçou, comprimia seu corpo ao meu. Segundos depois minhas pálpebras pesavam. Lutava para permanecer acordado. Fracassei: Caí em sono profundo.


***

   Devo ter passado no mínimo duas horas dormindo. O quarto estava iluminado. Acordei imobilizado: A cama possuía amarras ais quais eu estava preso; sem parte da minha ridícula fantasia de pirata. Só de calças. Ângela não estava mais ao meu lado.
   O quarto era outro, era assustador.
   Chamei por ela. Sem resposta.
   Minha vista estava embaçada. Minha voz não era nada. Apesar do esforço que eu fazia, de tentar me contorcer, saí da situação, era como se eu continuasse dormindo. Tudo aquilo era um sonho, um pesadelo. Minha água devia ter algo dissolvido. Estava drogado.
   Ângela aparece.
   Trocara de roupas. Estava numa minissaia; botas pretas de cano longo; uma camisa de estampa perturbadora com uma série de corpos mutilados banhados em sangue. Usava uma maquiagem mista de branco e preta, principalmente na região dos olhos.
   Em tom de zombaria, Ângela chegou ao perto de meu ouvido e disse:
   – Acordou?! Que egoísta! Era pra você me ajudar a dormir, não para dormir. – Dera um risinho. Tornou-se mais alto e mais alto à medida que falava.
   Maquiada, seu rosto se tornara mais pálido que antes. Brutal. Meus sentidos me confundiam e boa parte do que fora dito fora fragmentado pelo meu cérebro. Não via os braços, estavam postos atrás, nas costas. Ela escondia algo. Era a única preocupação. Foquei minha atenção exclusivamente nesse ponto. Ângela percebeu.
   – Curioso? Sabe o que tenho? Hã?
   Sem ter meios, não respondi.
   – É um presente. Para Guilherme. De aniversário.
   Na sua mão direita, Ângela segurava uma navalha.
   – Quem foi... Seu... A água...!
   – Parece que você continua dormindo.
   Ela pousou a navalha em meu peito.
   – As cicatrizes... Por que sumiram?
   O quê ela quis dizer com isso?
   – Ah, ah!... Não...!
   – Hum, agora sim. Olhe para mim! A segunda vez é ainda melhor. Quero que veja tudo, tudo! Como da última vez.
   Meticulosamente, a navalha cortava minha pela. Eram arranhões superficiais, mas eu estava apavorado e gemendo, temendo por minha vida.
   O sangue começara a escorrer.
   – Pro seu aniversário... Com amor!!
   Enfiara em meu braço direito a navalha. A dor foi tremenda. A partir desse ponto, tive a certeza que dali não escaparia. Podia me considerar morto.
   Ao ouvir meu grito, Ângela gritara também, como que uivando, saudando o meu sofrimento.
   A campainha tocou. Ela tapou minha boca.
   Eu transpirava feito um condenado. O choque fora tamanho que as dores que sentia nem se compararam o que viera depois.
   A campainha tocou novamente.
   Os olhos de Ângela penetraram os meus e numa súplica muda de cumplices era o mesmo que pedisse “silêncio!” da maneira dócil e tímida.
   A campainha tocou ao tempo que porta também era batida.
   – Ângela?! – Chamara do lado de fora
   Uma forte pancada fora ouvida, e outra, e mais outra, até que por fim a porta da frente veio a baixo. Ouvi nitidamente passos de pelo menos três ou quatro pessoas. Um musculoso homem de roupas brancas entrou no quarto e encontrou Ângela me beijando.
   – Ela está aqui?! – Gritara ele. Em rápidos movimentos, tirara Ângela de cima de mim e a imobilizara.
   – Me larga! Ah! SOCORRO! SOCORRO!!!
   O pálido rosto de Ângela estava vermelho como fogo. Esbravejara, gritara. Inacreditável: a força de uma menina franzina era superior ao do homem musculoso que, com extremo esforço, lutava para mantê-la imóvel.
   Outras pessoas entraram o quarto.
   Um deles era um homem usando roupas igualmente brancas, porém o físico era totalmente adverso do primeiro que me salvou a vida. Era mais velho, estando na casa dos cinquenta. Medindo uns 1 m 70 cm, gordo.
   Outro homem vestia-se com bermudas e uma camisa e uma camisa listrada. Sua expressão facial era a mais abalada daquele cômodo. Apesar de aparentar ser mais jovem que a figura citada no parágrafo anterior, seu rosto estava visivelmente desfigurado. Daria no máximo 1 m e 63 de altura. Magro como a filha
   O quarto visitante não precisa de descrição, visto que o homem que reteve Ângela partilha das mesmas características. Sua função também era a de controlar a garota. Este era o psiquiatra de Ângela, amigo de seu pai – o senhor de bermudas.
   O homem mais velho ministrou uma espécie de medicação e pouco a pouco Ângela foi ficando mais calma. Nesse meio tempo, tiraram-me da cama e chamaram uma ambulância.
   No hospital, na mesma noite, recebi a visita do psiquiatra. Ele me explicou que Ângela sofria de transtornos mentais. Ela jamais tentou matar ninguém, suas crises se limitavam a alucinações, nada violento. O nome da doença é esquizofrenia. Seu pai acreditava numa possível recuperação, por isso não permitira que “isolassem a menina num manicômio”. Os pais de Ângela tinham uma casa (a mesma que nos encontraram) onde só ela e uma enfermeira moravam. Decidiram que ela moraria afastada deles, pois era muito difícil para eles verem dia após dia a filha cada dia pior. Depois de um surto sério, os pais decidiram que o melhor seria interna-la no hospital – no início desse mês. Infelizmente, de alguma maneira, a garota fugira.
   – Que surto sério foi esse? – Estava curioso.
   – A garota deixara de ir para a escola, mas o seu namorado sabia o novo endereço de Ângela. Ela atacou o namorado assim como você.
   – Ele não sabia que ela estava pior?
   – Guilherme nem sabia que ela sofria de esquizofrenia. O rapaz ficou tão chocado durante dois dias sem abrir a boca.
   – O nome dele é Guilherme?
   – Sim, grande coincidência. Ela só falava no aniversário do namorado; falava numa comemoração.
   Conversamos durante alguns minutos. Depois ele se retirou e pude dormir a noite que restava.

   Saí do hospital na manhã seguinte. Minha mãe levou-me para casa sobre severas advertências. Não acreditava – continuo não acreditando – no que acontecera.
   O estranho é que, pensando agora, ela poderia ter me matado antes dos enfermeiros terem me socorrido, mas mesmo assim ela não fez. Ela me beijou. Será que naquela noite Ângela me amou? Certamente, nunca saberei com certeza. Eu a amei àquela noite, e isso é que é estranho.